quinta-feira, 5 de março de 2015

O EXERCÍCIO DA SURDEZ NA CONSTRUÇÃO DA AUTOESTIMA



Se me permitem a insistência na ideia: eu acredito que o que a gente veste é um texto. (...) posso dizer que a moda mudou a tal ponto o meu texto como pessoa, que transformou minha vida inteira. É sério. Vou contextualizar: eu sempre gostei de roupas diferentes desde que me entendo por gente, mas numa espécie de privação adolescente, (dessas que acontecem quando a gente quer muito se inserir num grupo de amiguinhos e ser querida, aceita, popular e tal e coisa) eu entrei num hiato criativo onde abandonei por completo todas as extravagâncias fashion que me eram peculiares e passei a usar as roupas mais simples possíveis. Camiseta, calça jeans e tênis. Sempre, todos os dias. E esse combo-cômodo virou minha farda por anos e anos e não era por não gostar de moda, mas por não encontrar de volta meu caminho para ela.

Acontece que, nessa tentativa louca de me encaixar, eu estava desajustando o ponteiro mais importante da minha vida: o da autoestima. Porque não adianta a gente lutar contra si mesma para agradar os outros. O efeito é inverso e, ao invés de aceitação, encontramos estranhamento, frustração e uma profunda disparidade entre o que somos, o que queremos ser e o que os outros pensam que somos. Resumindo: quando a gente nega as próprias vontades, nossa autoestima para de conversar com a gente e, dessa falta de diálogo, surge uma enorme folha branca, cujo texto deixamos de escrever.

E aí entra a moda. Ok, poderíamos escrever esse texto de várias maneiras, mas desde que o Homem se entende por gente que a moda é uma ferramenta que nos separa, reúne, identifica, destaca, evidencia, afasta e aproxima-nos uns dos outros, pelo menos à primeira vista. A moda é a matéria-prima do nosso estilo e, por isso, temos que lapidá-la à nossa essência para construir uma imagem exterior que condiz com o que somos por dentro.
Acontece que, saber usar a moda a favor do que realmente somos, é um caminho árduo de desprendimentos e descobertas.(...)
Quando me dizem que a moda dita isto, dita aquilo, que somos escravos, blá blá blá, eu sempre penso que as pessoas não estão olhando atentamente para as inúmeras possibilidades que o mundo fashion nos oferece e estão preferindo interpretar esses textos da forma mais negativa. A moda não dita. Ela apresenta, dá luz, sugere, e sugestões podem ser adaptadas, aceitas, ou descartadas. Fico louca quando vejo o que é desfilado nas ruas e nas passarelas das semanas de moda e sempre penso que o ser humano não tem limites para tanta criatividade. Então porquê ficamos no vestido bandage? Porquê o scarpin é nude? Porquê somos todas tão parecidas? Por que erroneamente julgamos que a autoestima deriva da aceitação social quando, na verdade, é um processo íntimo, pessoal e intransferível, de autodescobrimento.
Depois de constatar isso a duras penas, (...) eu cheguei à conclusão que a autoestima é um exercício diário de surdez: há que deixar de ouvir os outros para ser feliz com o que somos e queremos. É fato sacramentado que as pessoas ao nosso redor influenciam drasticamente nossa percepção sobre nós mesmas. Não é só a mídia que diz que as mulheres devem ser princesas. São nossas avós, pais, tias, primas, que comentam nossa excentricidade, é o namorado que reclama das nossas escolhas exuberantes, são os amigos, é a filha da vizinha que entorta a boca pro nosso lado, mas para todas essas situações tão arraigadas há gerações, eu desenvolvi um botão de “shut down” involuntário que desliga minha mente dessa massa de opinião que não me interessa: o famoso “entra por um ouvido e sai pelo outro“.
E assim, com o tempo, consegui construir um texto que faz todo o sentido para mim, mesmo que ninguém compreenda a língua. E não é que o resultado foi positivo? A moda me ajudou a criar um “envelope” mais interessante, uma ponte entre o exterior e a minha personalidade. Hoje eu sinto a diferença de ter quebrado essas barreiras e sei que o que as pessoas vêem em mim está bem mais próximo do que eu realmente sou, do que se eu vestisse o tal vestido bandage. Com o tempo essa ponte vai fortalecendo e edificando nossa autoestima e esse empoderamento exala pela nossa pele, brilha nos nossos olhos, estica nossa coluna, imposta nossa voz e traz firmeza aos nossos passos.
E mesmo numa sociedade meio mesquinha como a nossa, que vive de falar mal do corpo, do rosto, da roupa alheia, o discurso das pessoas em relação à nossa imagem começa a mudar: ao invés de recebermos comentários do tipo “que combinação horrível que você fez! cafona pra cacete!”, a gente começa a ouvir “putz! tudo que você veste é massa! original! até o que eu não teria coragem de vestir, fica lindo em você.” Mas não é o olhar dos outros que está sendo condescendente, iluminado por uma percepção fashion apurada ou abrindo os horizontes para estilos diferentes, somos nós mesmas que enfrentamos o espelho com prazer, inspiramos respeito e nos tornamos capazes de segurar qualquer look com uma soberania tão assertiva, que se torna impossível não admirar a exuberância de tamanha coragem.
Por: Carol Buro do blog Small Fashion Diary.

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Apaixonada por moda, maquiagem, viagens e compras! 18 anos, pisciana nata, adora passar horas pesquisando sobre tudo que a deixe mais pertinho do mundo da moda, então, conte-me tudo mulher!
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